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12.12.2006

Os Juros nas Cédulas e Notas de Crédito Industrial, Rural e Comercial

Apesar das recentes Súmulas editadas pelo Superior Tribunal de Justiça, quase todas contrárias aos interesses dos consumidores clientes de instituições financeiras, a verdade é que, para determinadas espécies de contratos firmados com instituições financeiras, os juros remuneratórios continuam limitados ao percentual de 12% (doze por cento) ao ano.

Essa afirmação vale para os ajustes havidos com base nos Decretos-Leis nº 413/69 e 167/67, assim como na Lei nº 6.840/80, que regulamentam, respectivamente, as Cédulas ou Notas de Crédito Industrial, Rural e Comercial.

A limitação se dá porque esses diplomas legais, que vieram à tona no contexto de desenvolvimentismo dos governos militares pós-64, expressam o objetivo de impulsionar a expansão tanto da indústria quanto da atividade rural, conceito esse posteriormente apropriado também para a atividade comercial. Em qualquer dos casos, o que se pretende é abreviar a concessão do crédito e fomentar o investimento, criando, entre outros efeitos concretos, o que se convencionou chamar de ‘crédito incentivado'.

Tendo por base essa intenção, as referidas espécies legislativas não deixaram as taxas de juros ao arbítrio das casas bancárias. De fato, assim nem poderia ter sido, visto que a finalidade desse tipo de operação era, e é, justamente o incremento das atividades industrial, rural e comercial, sendo certo que nenhuma atividade pode ser fomentada se submetida às regras comuns, ordinárias, do mercado de crédito, no mais das vezes regidas tão-somente pelo interesse de lucro da instituição financeira, o que não se constitui em crítica, mas em constatação.

Exatamente por essa razão, aliás, é que cada um dos diplomas legais mencionados traz em seu corpo um comando semelhante: "As importâncias fornecidas pelo financiador vencerão juros e poderão sofrer correção monetária às taxas e aos índices que o Conselho Monetário Nacional fixar, ..." (art. 5º do Decreto-Lei nº 413/69).

Ocorre que, apesar de passados já vários anos, o Conselho Monetário Nacional não se desincumbiu dessa tarefa. Em outros termos, o CMN simplesmente não fixou as taxas de juros.

Embora os argumentos das instituições financeiras, no sentido de que essa disposição legal somente ‘possibilitaria' ao CMN fixar as taxas, o que se observa é que o Poder Judiciário tem a questão já pacificada, reconhecendo que se trata de obrigação, e não de opção do CMN, obrigação essa que, uma vez não cumprida, e considerando, em paralelo, que se trata de crédito incentivado, fica atraída a incidência da limitação dos juros remuneratórios no patamar de 12% (doze por cento) ao ano, na forma do que prevê o art. 1º do tão conhecido Decreto nº 22.626/33: "É vedado, e será punido nos termos desta lei, estipular em quaisquer contratos taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal (Código Civil, art. n. 1.062).

Demais disso, a manutenção dos juros nesse percentual fundamenta-se também na circunstância de que as legislações que embasam os títulos (cédulas e notas) de crédito industriais, rurais e comerciais, são posteriores à Lei nº 4.595/64, que "Dispõe sobre a Política e as Instituições Monetárias, Bancárias e Creditícias, Cria o Conselho Monetário Nacional e dá outras providências.", aplicando-se a regra jurídica de que lei posterior revoga lei anterior. Somem-se a esses argumentos, ainda, o fato de aqueles diplomas legais terem regulado inteiramente as respectivas matérias, sendo, pois, caso de revogação de lei (Lei nº. 4.595/64) no que toca às questões por elas tratadas.

Vale a observação de que, nessas espécies de contratos, de regra os valores envolvidos são bastante expressivo, principalmente nos casos de operações efetuadas com base em Cédulas de Crédito, o que conduz a uma também expressiva diferença entre o percentual de juros pretendido pelas instituições de crédito e aqueles que legalmente podem ser cobrados, onerando o tomador, desse modo, tanto ilegal quanto desnecessariamente.

A título de ilustração da limitação aqui retratada, vale transcrever um curto e objetivo trecho de recente decisão do Superior Tribunal de Justiça: "Por ausência de deliberação do Conselho Monetário Nacional, a taxa de juros remuneratórios está limitada em 12% ao ano para as cédulas de crédito rural, comercial e industrial. Precedentes." (REsp 256691, Rel. Min.ª Nancy Andrighi, julgado em 16/06/2005).

A matéria, atualmente, encontra-se pacificada, principalmente junto aos Tribunais Superiores, o que não tem impedido que os bancos sigam exigindo taxas de juros superiores às legalmente permitidas.

Em vista dessa realidade, a conclusão é a de que é prudente a busca do Poder Judiciário para, nas operações realizadas com base em Cédulas ou Notas de Crédito Industrial, Rural ou Comercial, adequar os juros remuneratórios ao patamar legal.

Zulmar Neves Advocacia