Artigos

15.03.2010

A Inconstitucionalidade da Cédula de Crédito Bancário

A Cédula de Crédito Bancário, instrumento bastante utilizado pelas Instituições Financeiras na concessão de empréstimos ou repactuação de dívidas, foi criada pela Medida Provisória n.º 2.160-25/2001, a qual foi revogada pela Lei n.º 10.931/2004, e, segundo seu artigo 25, é um título de crédito que representa a promessa de pagamento em dinheiro, decorrente de operação de crédito de qualquer modalidade.

A mesma Lei dispõe que a Cédula de Crédito Bancário é um título executivo extrajudicial e representa dívida líquida, certa e exigível,"seja pela soma nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo, ou nos extratos da conta corrente".

Ou seja, as Instituições Financeiras não só podem utilizar-se da Cédula de Crédito, como ainda, pela letra da Lei, estão autorizadas a utilizar o processo executivo extrajudicial para cobrança do crédito decorrente do referido título.

Diz-se isso porque o legislador criou a Cédula de Crédito Bancário, visando legitimar a cobrança de um contrato de abertura de crédito em conta corrente através do procedimento de execução de título extrajudicial, o que já havia sido rechaçado pelo Superior Tribunal de Justiça desde o ano de 1999, quando foi editada a Súmula 233, a qual dispõe que"O contrato de abertura de crédito, ainda que acompanhado de extrato de conta-corrente, não é título executivo".

Para que se tenha claro, o procedimento de execução de título extrajudicial somente é admitido para títulos que estejam revestidos de liquidez, certeza e exigibilidade, requisitos que não estão presentes no caso do contrato de abertura de crédito em conta-corrente.

Ou seja, a partir da publicação da Lei em questão, não só foi criada a Cédula de Crédito Bancário, como também foi legitimada a cobrança de tal título pelo procedimento de execução de título extrajudicial, ainda que se trate de um contrato de abertura de crédito em conta-corrente, o qual, gize-se, não se reveste dos requisitos da liquidez, certeza e exigibilidade.

Entretanto, os artigos 26 a 45 da Lei 10.931/2004, que criaram a Cédula de Crédito Bancário, são inconstitucionais, diante da sua forma de criação e conteúdo. Senão vejamos.

A Medida Provisória n.º 2.160-25/2001 criou a Cédula de Crédito Bancário e, posteriormente, foi revogada pela Lei 10.931/2004.

Conforme sabido, para edição de Medidas Provisórias é indispensável que estejam presentes os requisitos da urgência e relevância da matéria a ser regulamentada, os quais não estavam presentes no caso da Medida Provisória n.º 2.160-25/2001.

Não fosse somente isso, a Lei n.º 10.931/2004, que revogou a Medida Provisória referida, consolidando a criação da Cédula de Crédito Bancário, tem como objeto a regulamentação do patrimônio de afetação das incorporações imobiliárias. Ou seja, trata de assuntos que não guardam qualquer relação entre si, sendo evidente o vício de inconstitucionalidade por infração ao processo legislativo.

É que a Constituição Federal prevê a impossibilidade da elaboração de uma Lei (excetuadas as codificações) que regulamente mais do que um objeto. No caso, houve a edição de uma Lei para tratar sobre o patrimônio de afetação das incorporações imobiliárias e, sorrateiramente, foram inseridos os artigos 26 a 45, os quais instituíram a Cédula de Crédito Bancário.

Portanto, a Cédula de Crédito Bancário é inconstitucional, diante da ausência de urgência e relevância da matéria para a edição da Medida Provisória n.º 2.160-25/2001 e, ainda, diante de que é vedada a regulamentação, em uma mesma Lei, de matérias que não são conexas ou correlatas.

Dessa forma, entendemos que é possível a declaração de nulidade da Cédula de Crédito Bancário, por inconstitucionalidade dos dispositivos legais que a criaram, tendo como consequência direta a impossibilidade de sua cobrança, mediante execução de título extrajudicial.

Fábio Dal Pont Branchi