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06.11.2015

Sucessão familiar em tempos de aumento de impostos

Muito tem se falado sobre antecipação da sucessão e planejamento familiar, especialmente em face da instabilidade econômica pela qual passa o país e o risco iminente de aumento de impostos. Nesse sentido, o Brasil, sem dúvidas, continua sendo o país mais barato para se morrer no mundo.

De acordo com a Constituição Federal, o imposto sobre transmissãocausa mortise doação de quaisquer bens ou direitos é de competência dos Estados e do Distrito Federal, cujas alíquotas máximas são fixadas pelo Senado Federal.

O Estado do Rio Grande do Sul já teve grande variação de alíquotas nos últimos anos. A alíquota atual, e que vigorará até 31 de dezembro de 2015, é de 3% para doação e 4% para a transmissãocausa mortis.

A partir de 1º de janeiro de 2016, no entanto, conforme Lei Estadual n.º 14.741, de 24 de setembro de 2015, as alíquotas passarão para 4% para doação e progressiva de 0% a 6% para a transmissãocausa mortis,conforme o valor dos bens a serem inventariados.

De acordo com a Resolução n.º 9, de 5 de maio de 1992, do Senado Federal, a alíquota máxima do ITCD será de 8%. Portanto, existe a possibilidade, assim como já foi no passado, de as alíquotas gaúchas serem fixadas no teto de 8%.

Esse teto já vem sendo discutido há algum tempo, sob a premissa de que no Brasil é barata a tributação dos bens na sucessão. Nesse sentido, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), em agosto deste ano, propôs ao Senado Federal o aumento da alíquota máxima para 20%.

Atento à crise financeira dos Governos Estaduais, é quase certo que o Senado Federal elevará o teto da alíquota para, pelo menos, 20%, permitindo com que os Estados elevem suas alíquotas.

Pelo que se sabe, existe interesse do Governo Federal em receber parte dessa receita do ITCD, atualmente exclusiva do Estado. Para que isso ocorra, no entanto, será necessária uma emenda constitucional.

O processo legislativo de uma emenda constitucional é mais complicado que a alteração de uma Resolução do Senado Federal. Porém, considerando a sanha arrecadatória estatal, isso também nos parece como certo, restando apenas saber quando ocorrerá.

Bem planejada, a sucessão pode ocorrer de forma harmônica e econômica. Importante quando se pensa em uma sucessão é que esta seja motivada por caráter pessoal e não meramente fiscal. Não são raros os casos de doadores que, ao transmitirem seus bens para seus herdeiros, entram em depressão por não se encontrarem mais sob o controle de seu patrimônio.

É evidente que existem mecanismos para proteger o doador, como, por exemplo, o usufruto, que mantém o doador econômica e politicamente resguardado. Contudo, no mais das vezes, não ter o patrimônio em seu nome é algo que o doador não consegue enfrentar.

Nesse particular, a análise inicial parte do que é possível doar. De acordo com o Código Civil, nosso patrimônio é dividido em duas partes: uma parte (50%) é disponível, ficando sua destinação ao arbítrio do proprietário, e outra parte (50%) é indisponível.

A parte indisponível é denominada pelo Código Civil como “legítima” e pertence aos herdeiros necessários, que são os filhos, pais e o cônjuge. Portanto, o doador pode dispor para outros que não os herdeiros necessários apenas a parte disponível de seu patrimônio.

Claro que o doador poderá doar também a parte legítima, desde que o faça para os herdeiros necessários, o que constituirá um adiantamento de legítima para eles.

O adiantamento de legítima acarreta na colação dos bens doados no momento de falecimento do doador. A colação, por sua vez, nada mais é do que a equalização da herança entre os herdeiros, isto é, todas as doações em vida, com exceção daquelas que saírem da parte disponível, serão conferidas para cálculo da divisão da herança.

Já no que se refere à parte disponível, o doador pode doar seu patrimônio para quem bem entender.

Importante consignar que, em qualquer hipótese, o doador deve reservar para si recursos e patrimônio suficientes para manter uma vida digna e, de forma alguma, pode prejudicar eventuais credores, sob pena de o ato ser considerado nulo e, portanto, sem efeito legal algum, prejudicando toda a doação efetuada.

Assim, todas as doações que excederem ao que cabia ao herdeiro, desconsideradas as doações que saírem da parte disponível, serão reduzidas para os percentuais legais, de modo que nenhum herdeiro seja prejudicado.

A doação, desde que por fundadas razões, pode ainda estabelecer cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade, incomunicabilidade e reversão.

Muitos planejamentos se utilizam de uma estrutura societária para garantir harmonia na sucessão. Por vezes não é conveniente doar determinado bem para determinado herdeiro ou então fracionar esse bem em tantos quantos forem os herdeiros.

Via de regra, a constituição de uma sociedade do tipoholding, com a conferência dos bens para seu capital, com a posterior doação das quotas ou ações dessa sociedade, com ou sem reserva de usufruto, traz a harmonia buscada pelo patriarca. Harmonia na divisão futura do patrimônio (que é um só), evitando a discussão sobre a qualidade e valores dos bens deixados, e a administração desse patrimônio por quem melhor estiver preparado.

Essa sociedade poderá, por exemplo, ter por objeto social a administração de bens imóveis e incorporação imobiliária, com isso, apesar da necessidade de recolher o ITBI na versão de bens imóveis, trará economia de imposto de renda, pois a tributação para renda de aluguéis e para lucros auferidos com a alienação de imóveis por uma pessoa jurídica com atividade imobiliária é muito menor do que a tributação para essas mesmas atividades quando realizadas por uma pessoa física.

Enfim, essa é só uma das várias possibilidades quando se fala em harmonização da sucessão.

Outra possibilidade, por exemplo, pode ser o testamento, que pode ser feito sozinho ou combinado com uma estrutura societária. O testamento é uma excelente forma de estabelecer o destino de determinados bens que saiam da parte disponível, os chamados “legados”; ademais, sabe-se que o testamento não dispõe somente sobre a disposição de bens, mas também certas vontades do testador.

Portanto, concluímos que não existem fórmulas prontas para um bom planejamento sucessório. O que existem são roupagens jurídicas que os profissionais do direito devem ter habilidade de aplicar para cada caso, sempre observados os desejos e anseios do patriarca.

Sillas Battastini Neves