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25.11.2025

A Herança Digital e os Novos Desafios do Direito das Sucessões

Tradicionalmente voltado à transmissão de bens materiais, o Direito das Sucessões enfrenta hoje um novo desafio: a sucessão de bens digitais. 

Na era virtual, parte expressiva do patrimônio das pessoas, como contas, arquivos, criptomoedas e perfis online, está armazenada em ambientes eletrônicos. A morte, portanto, também alcança esse patrimônio intangível, exigindo respostas jurídicas adequadas.

Os bens digitais podem ter natureza econômica (criptomoedas, milhas, saldos em carteiras virtuais) ou afetiva (fotos, mensagens, e-mails, perfis em redes sociais). 

O problema central é a ausência de legislação específica sobre sua identificação, avaliação e destinação. Diante desse vácuo, o Poder Judiciário passou a definir parâmetros para a chamada herança digital.

Em decisão paradigmática, o STJ, no Recurso Especial nº 2.214.424/SP, relatado pela Ministra Nancy Andrighi, reconheceu que os bens digitais integram o inventário, tal como os bens físicos. 

O Tribunal distinguiu entre bens patrimoniais digitais, transmissíveis aos herdeiros, e bens existenciais digitais, ligados à intimidade e à memória do falecido, cuja transmissão é excepcional e sempre sob controle judicial. Essa diferenciação busca equilibrar o direito à herança e o direito à privacidade.

Para aplicar esse entendimento, o STJ sugeriu o Incidente de Identificação, Classificação e Avaliação de Bens Digitais, a ser conduzido dentro do inventário, com auxílio de um Inventariante Digital, profissional capacitado para mapear ativos virtuais sem violar a intimidade do falecido. 

Todo o procedimento deve tramitar sob segredo de justiça, garantindo a privacidade póstuma.

A decisão também ressalta a importância do planejamento sucessório digital, permitindo que o testamento defina a destinação dos ativos virtuais, indique um executor digital e estabeleça o destino de perfis e dados pessoais, evitando conflitos e assegurando segurança jurídica à família.

Em síntese, o julgamento do STJ marca um marco judicial para a herança digital no Brasil, oferecendo diretrizes inovadoras mesmo na ausência de lei específica. 

O Direito das Sucessões mostra, assim, sua capacidade de se adaptar à era tecnológica, conciliando tecnologia e dignidade humana na proteção do patrimônio digital.

Gustavo José Dani

Advogado ZNA