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29.09.2015

A Prova como Direito Fundamental e a (In)Admissibilidade da Prova Ilícita no Processo Civil

Considera-se fundamental o direito não porque ele está positivado no Título II da Constituição Federal, mas sim porque pode ser identificado pelo seu conteúdo e pela sua essência, sendo ele indispensável à dignidade da pessoa humana, de modo que não há empecilho para que se reconheçam direitos fundamentais fora do referido Título, tendo em vista que, de acordo com o art. 5º, § 2º, da CF,“os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.

Dessa forma, a partir da leitura sistemática dos valores constitucionais, encontra-se a ela intrínseco o direito fundamental à prova, emanado, como um desdobramento da garantia constitucional do devido processo legal ou um aspecto fundamental das garantias processuais da ação, da defesa e do contraditório.

No entanto, importante destacar que o art. 5.º, LVI, da Constituição Federal veda a produção, no processo, da prova obtida ilicitamente. Trata-se de direito fundamental do jurisdicionado: o direito de não ver produzida contra si uma prova ilícita ou obtida ilicitamente.

A prova ilícita é entendida como uma violação de normas de direito material; no entanto, são as normas processuais que determinam as provas admissíveis ou não. E, em razão da autonomia do direito processual em face do direito material, se uma determinada violação de norma na obtenção da prova não estava prevista como causa de exclusão da prova pelas regras procedimentais, então o elemento de prova respectivo deveria permanecer no processo.

Nesse sentido, um dos critérios utilizados para aferir a admissibilidade ou inadmissibilidade da prova é saber se o seu conteúdo, se a forma como foi obtido o material probatório ou se o meio através do qual ele é inserido no processo são lícitos.

Ocorre que, do mesmo modo que se pode falar na existência de um direito fundamental à vedação da prova ilícita, é induvidosa a existência do direito fundamental à prova. Trata-se de direitos que não se contradizem; pelo contrário, eles se complementam: o direito à prova é limitado pela legitimidade dos meios utilizados para obtê-la. O problema é que é possível que, no caso concreto, esses direitos fundamentais entrem em rota de colisão.

Há quem não admita a prova ilícita em hipótese alguma; há quem a admita sempre; há quem a admita apenas no processo penal, e desde que em favor do acusado; e há quem defenda a aplicação do princípio da proporcionalidade para a solução do conflito.

A prova ilícita é defeituosa e acarreta a nulidade da decisão que a toma por base, desde que o faça como único ou principal fundamento. O argumento mais invocado para justificar a admissibilidade da prova ilícita é o de que não haveria vedação expressa, circunstância que, aliada à taxatividade das nulidades processuais, tornaria obrigatória a admissão de todas as provas ilícitas, desde que pertinentes e relevantes.

Contudo, essa posição não deve ser entendida em termos absolutos, tendo em vista que vigora, nos países filiados à proibição das provas ilícitas, inclusive no Brasil, a teoria da proporcionalidade.

Cumpre salientar que o uso da prova ilícita, mesmo que dependente dessa ponderação, apenas pode ser aceito quando a prova foi obtida ou formada ilicitamente porque não existia outra forma para se demonstrar os fatos em juízo. A prova ilícita, portanto, só pode ser admitida quando é a única capaz de evidenciar fato absolutamente necessário para a tutela de um direito que, no caso concreto, merece ser realizado, ainda que diante do direito da personalidade atingido.

Atualmente, o entendimento da jurisprudência brasileira tem sido no sentido de se levar em conta os bens conflitantes no caso concreto sempre os ponderando à luz do princípio da proporcionalidade.

Portanto, o princípio da proibição da prova ilícita não é absoluto – até porque não existe nenhum direito fundamental absoluto – podendo ceder, quando em colisão com outro direito fundamental de maior peso, no caso concreto.

Patrícia Pantaleão Gessinger Fontanella