Artigos

06.03.2012

Execução Definitiva da Astreinte

Inicialmente, sabe-se que a astreinte é uma penalidade aplicada às partes para fazer cumprir determinação judicial de obrigação de fazer ou não fazer, normalmente na periodicidade diária, não se confundindo com a obrigação principal, pois esta segue existindo. É um valioso instrumento processual, pois torna o processo mais efetivo, visto que sua multa força a parte obrigada por ela a cumprir o determinado, dada a ameaça de responder com seu patrimônio.

No entanto, quando se trata de astreintes, surgem muitas dúvidas, pois a lei silencia no que se refere à definição da data em que a multa poderá ser exigida, conforme se observa no artigo 461 do Código de Processo Civil, dispositivo aplicado à matéria. Assim, as incertezas ocorrem, basicamente, no sentido de se ter conhecimento de qual momento poderá ser exigida a astreintes, se antes ou depois da sentença de mérito e, se possível, antes da sentença, se da forma definitiva ou provisória.

Quanto à primeira questão, já resta bem compreendida pela jurisprudência e pela maioria da doutrina a independência da astreinte com o resultado da demanda, razão pela qual há o entendimento de que é desnecessário o trânsito em julgado da sentença do processo que fixou a multa, pois é justamente a possibilidade de exigibilidade imediata da astreinte que dará a esta o caráter coercitivo suficiente para ensejar o cumprimento da obrigação, sujeitando o devedor a cumprir a obrigação de uma forma rápida e concreta.

Caso houvesse a possibilidade de execução da multa só após o trânsito em julgado, seu poder restaria limitado significativamente, descaracterizado, ou reduzido a quase zero, seu objetivo principal, que é a coerção.

Sendo assim, a partir do dia em que começar a incidir a multa, faculta-se ao credor exigi-la, de pleno direito, através do procedimento da execução por quantia certa, cabendo apenas verificar se a execução deverá ser da forma definitiva ou provisória.

Sobre tal ponto, existem maiores divergências, pois há dúvidas em relação à faculdade ou não da execução definitiva, uma vez que a lei não dispõe sobre esta possibilidade, ao passo que também não regulamenta a forma de cobrança da astreinte. Contudo, a execução provisória de que trata o art. 475-O do CPC não parece ser razoável ao caso, pois compromete a parte exequente com os ônus previstos no seu dispositivo legal, o que acaba por inibi-la de executar provisoriamente a multa.

Dessa forma, verifica-se que, contrariamente às medidas antecipatórias, que têm por objeto a mesma relação jurídica a ser examinada pela sentença (obrigação de direito material), que poderia ensejar uma execução provisória, as decisões que fixam multa são decisões que definem outra norma jurídica individualizada, diferente da que é objeto do processo, pois surgida por fato gerador novo, que foi o descumprimento de ordem judicial (obrigação de direito processual), ocorrida no curso do processo e por causa dele, razão pela qual independem do julgamento do mérito da ação.

Sendo assim, o único pressuposto para a possibilidade da execução definitiva é verificar a preclusão da decisão que operou a multa. Caso a decisão que ensejou a multa estiver sendo descumprida, bem como não tenha sido objeto de qualquer impugnação, estando, portanto, preclusa, e descumprida, não há de se falar de execução provisória, e sim em execução definitiva.

Ou seja, independentemente da solução que for dada à causa principal, as decisões interlocutórias que fixam multa têm via própria e, operada preclusão em relação a elas, podem servir de título executivo hábil para a execução definitiva, pois o que autoriza sua aplicação é a violação da ordem judicial, razão pela qual será considerada para a execução definitiva da astreinte somente a relação jurídica existente entre parte e juiz.

No mais, quanto a eventual alegação de que é necessário aguardar-se o trânsito em julgado da sentença para que a parte promova a execução definitiva do montante oriundo da multa, uma vez que a tutela que definiu a multa poderá ser revertida, essa não merece prosperar, pois, mesmo nesse caso, a multa restará devida, pois o fundamento de sua aplicação é a desobediência a uma decisão judicial, não tendo qualquer ligação com o mérito do processo.

No entanto, importante deixar claro que, caso a astreinte tenha sido aplicada para forçar o cumprimento de obrigação determinada em sentença ou acórdão, aí sim se deve aguardar o trânsito em julgado da decisão, pois cabível recurso, não se confundindo, assim, com a decisão que fixou multa proferida no curso do processo, que pode já estar preclusa.

Dessa forma, a execução definitiva por quantia certa é o caminho mais viável e condizente com o artigo 461 do CPC, desde que cumpridos seus requisitos, pois o fato gerador da multa não é o direito material a ser tutelado, e sim o descumprimento de determinada decisão judicial, razão pela qual não há de se falar em aguardar o trânsito em julgado da demanda principal, ou então eventual execução provisória em razão disto, pois, mesmo quando do momento da análise de mérito, independentemente de qual vai ser a decisão proferida, nada mudará o fato de uma das partes ter descumprido a determinação judicial, que foi passível de recurso, sendo respeitados, portanto, todos os princípios norteadores da prestação jurisdicional, inclusive o do devido processo legal e da ampla defesa.

Assim, como forma de coibir os reiterados descumprimentos das ordens judiciais, há a necessidade de se admitir a autonomia das astreintes em relação ao direito material invocado, permitindo a imediata e definitiva execução da multa, possibilitando assim um processo mais efetivo e que visa ao adimplemento das obrigações.

Gabriel Teixeira Ludvig